quarta-feira, 27 de junho de 2012

Lembranças de uma amizade inesquecível - Mário Jequibau Albanese

Completei em 1949, ainda com dezessete anos, o Curso Superior de piano no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo. O convite partiu do José Raphael Musitano Pirágine, inseparável companheiro de conservatório, que insistiu que naquela noite conheceríamos um violonista de raros predicados. Pondere-se que àquela época o meu interesse exclusivo era para o piano, o mais completo instrumento de cordas percutidas e tessitura de oitenta e oito (88) notas. Assim, a recusa veio pronta. Todavia, o companheirismo e a amizade que nos une até hoje, pesaram na decisão. Fomos para a Rua Pires da Mota, esquina com a Avenida Aclimação, para ouvir um violonista que num instrumento de campo sonoro de três oitavas e uma quinta, 29 sons, mudou completamente o significado, não só do violão como instrumento, como também do meu conceito sobre música. Conheci um gênio! Aníbal Augusto Sardinha, artisticamente conhecido por GAROTO. A partir dai convivemos por sete anos até seu desenlace aos três dias de maio de 55, deixando imorredoura saudade. Garoto, Aníbal Augusto Sardinha, nasceu paulistano aos 28 dias de junho de 1915, e é o Patrono dia do Choro em São Paulo.
Quanto à parceria, foi somente uma: Amor Indiferença. No dia 22 da agosto de 1950 Garoto esteve na casa de meus pais, Rua Tupinambás, 164, no Paraíso, em São Paulo, quando incentivado por ele, coloquei letra na música fazendo a transcrição para piano em Mi bemol. Garoto adorou! A letra não perdoou nem a escala dos tons inteiros, também conhecida como escala hexafônica. Essa visita teve registro porque Garoto escreveu na hora a linha melódica de uma música que se tornou um desafio para os violonistas, com a seguinte dedicatória: "Desvairada, valsa de Garoto para o Mário e Senhora sua mãe Dona Clara, ofereço sinceramente".Fato que ser´comprovado por quem me honrar com uma visita. Editada no álbum comemorativo dos 100 anos do Choro em 1977, pela editora Fermata. No livro de Irati Antônio e Regina Pereira, “Garoto – Sinal dos Tempos”, lançado pela FUNARTE em 1980, essa composição aparece como sendo ainda inédita e com o nome de Jorge do Fuza... Como diria o filósofo: São coisas do futebol!!!
A composição “Meu Amigo Garoto”, que lhe foi dedicada em vida, relembra que em abril de 1955, subindo de táxi a Rua Machado de Assis, SP, perto das 23h00, encontro o Garoto, sozinho, na porta do prédio de nº 273, esperando pelo Ivo Araújo que ali morava. Não tive dúvida e o sequestro foi consentido, aconteceu naturalmente... Fomos ao centro da cidade e na Av. Ipiranga encontramos com o Duilio Cosenza, violonista brasileiro em atividade nos EUA que, diante do Garoto, teve uma reação que misturou felicidade, emoção e surpresa. Juntos fomos até o Maravilhoso, Taxi Dancing, para ouvir Meu Amigo Garoto interpretada pela orquestra do querido e sempre lembrado Osmar Milani em arranjo especial do maestro. Garoto foi recebido com entusiasmo e muitos aplausos.
Meu Amigo Garoto foi gravada por Sylvio Tancredi (LP Chantecler CMG 2028). Eu a gravei no LP Odeon (MOFB 3111) Mário Albanese – Insonia.
O pensamento cria, o desejo atrai e a fé no trabalho realiza. Com particular consideração e muita amizade,
Mário Jequibau Albanese.

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